Ei, bom dia.
Sente-se um tico, vamos ter uma daquelas conversas que há meses não temos. Não! não faça essa cara de quem acaba de ver um fantasma. Ninguém morreu, eu só quero ter aquele tipo de conversa que as pessoas têm andando, mexendo em alguma coisa, quase nunca prestando atenção de fato. Não, eu não sei porque as pessoas fazem isso.
Sabe? sentar, sentir seu cheiro de avelã e ver seus olhos bailando, trocando de foco à cada 5 segundos, às vezes semicerrando, passando um certo interesse no que digo, me transmite até um ar, um oxigênio tão familiar, não sei ao certo, deve ser porque uma vez meu pai me disse que ninguém consegue fitar por muito tempo e então as pupilas ficam bailando até encontrar uma maneira de se sentirem confortáveis. Teus olhos sempre bailam quando encontram-se com os meus. Tu não se sente confortável ao me fitar?
Digo, não era bem sobre isso que eu queria conversar. Na verdade, antes de me esvaziar, tu aceita um copo de chá? É de gengibre, nesse clima seco que está rodeando nossa cidade, te faria um bem danado se tomasse. Andei cinco quarterões só ontem e vi cerca de dez pessoas turcindo, pigarreando, espirrando, estamos cercados de vírus. Tome, tem um gosto bem gelado no final dele, embora ele esteja quente a bessa. Também não te quero pigarreando por ai, nem turcindo desenfreadamente. Quando turcimos demais, machuca a garganta, fora que dá umas paradas bruscas nos batimentos cardíacos, engasgos... Tudo bem, tudo bem, eu sei que exagero às vezes, mas não sei... Só não quero te ver doente, assim como as saudades, a falta de amor, a ausência do afago, coisas assim machucam, a debilitação do corpo também ferem. Não consigo te imaginar, an... Só tome o chá, não fiz café hoje, desculpe, sei que tu gosta, aliás, dificilmente existe alguém que não goste, sabe? Ando evitando o café... Mas tome o chá, quem sabe tu não pega apreço por ele?
Ah sim, eu dou muitos rodeios. Na verdade eu queria saber como tu esta, o que tem feito, o que tem pensado. É que tu se afastou de um jeito tão agressivo, que não teve jeito, encostou em mim e arranhou um tico. Eu até pensei em te dizer "Ei, volte aqui e me devolva o pedaço que tu carregou aí" Porém não sei direito, preferi ficar no meu canto, com meu café e sei lá. Qualquer outra coisa. O ruim é que esses arranhões ficam ardendo, mas passa. O chato é a minha anemia, qualquer arranhãozinho que eu adquiro a cicatriz é eterna. Certa feita, cortei meu braço com uma ponta de fio que eu não sei que diabos de onde surgiu, dois anos desde então e a marca pendura. O que quero dizer é que teu esbarro na hora que tu foi, sabe-se lá para aonde, pro mercado, pra padaria, pro parque, pra parada, pra qualquer canto que eu não sei bem, ainda está na minha pele e vai demorar pra sair, porque eu conheço bem o meu corpo.
Eu sinto tua falta, dos sorrisos, das ligações, do jeito como interagíamos. Talvez seja paranoia minha, mas todas as vezes que nos encontramos a atmosfera pesa, parece que a gravidade puxa a gente com mais força e nos finca de uma maneira tão brusca que até para andar é como se houvessem cinco sacos de arroz nas nossas costas.
Tu não me olha, eu não te olho. É como se houvesse um muro nos atravessando, nos dividindo. Talvez a culpa seja minha, talvez...
Mas esses fatos não mudam a falta que tu tem feito. Meus olhos estavam acostumados com os teus e de repente eles se viram tendo que se acostumar com o meu quarto bagunçado e com pilhas de livros pra todo canto. Nem ler eu ando querendo mais.
Sabe? Eu queria te dizer que teus lábios são macios, como algodão doce, ou até mesmo algodão. São feito plumas, e quando eu fecho os olhos e me lembro deles, a saudade vem como o Catrina. Nunca senti falta de um beijo como eu sinto do teu. (Depois de Dormir)
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